29/09/2008 - 08:51
NORTH HILLS, Nova York - Quando Wall Street ruiu e a poeira finalmente abaixou, o que chamou a atenção de Mitchell Frank foi isso: as pessoas numa fila na Rua 42 para olhar a lista de empregos afixados num mural, famintos, visivelmente famintos, não por comida, mas por um emprego.
E isso é o que chamou a atenção de Herbert Marks: quão orgulhoso ele estava por ter conseguido economizar US$ 5 em notas e moedas para dar a seu pai para que tivesse algum dinheiro durante uma reunião no Oddfellows Lodge.
"Ele não sabia se devia aceitar", relembra Marks, sentado ao lado de Frank na falsa biblioteca britânica da comunidade assistencial Bristal em Long Island. "Todos estavam na mesma situação, mas ter US$ 5, ter algo no bolso, naquela época significava muito. Eu nunca me esquecerei".
Isso aconteceu há muito, num tempo em que adolescentes como Frank reuniam pedaços de carvão usados pelos trens para aquecer suas casas.
Frank tem 97 anos e Marks fará 99 em janeiro. Ambos se lembram do crash da bolsa de valores de 1929 e da Depressão que se seguiu como se tivessem acontecido na semana passada.
Nas finanças, o passado quase nunca é um prólogo preciso e a idade só garante experiência, não sabedoria. Talvez a crise financeira atual seja precursora de um desastre e talvez seja apenas um momento particularmente agitado dos mercados, mas para os cerca de 2,1 milhões de americanos com 90 anos ou mais, nascidos mais perto da Guerra Civil do que da guerra no Iraque, é difícil não pensar no período em que o pânico financeiro se tornou um desastre financeiro há quase 80 anos.
Divergências e afinidades
Algumas vezes Frank e Marks têm opiniões divergentes, como sobre a capacidade das pessoas em lidar com um desastre daquela proporção nos dias de hoje.
"As pessoas estão acostumadas a muito mais. Elas tiram um ano de férias para viajar pela Europa depois da universidade. Eu não sei como elas reagiriam, realmente não sei", disse Frank, sacudindo a cabeça.
"Um homem de 50 anos, por exemplo, com dois filhos na faculdade, uma casa cara, como ele conseguiria manter isso? Como ele conseguiria encontrar o mesmo tipo de emprego?"
"Eu discordo", disse Marks, colocando a mão gentilmente sobre o apoio da cadeira. "Nossa geração conseguiu, a próxima geração conseguirá e a outra também. As pessoas aprendem e agora elas têm ainda mais com o que aprender".
Mas ambos compartilhavam uma certa inquietação, como se acreditassem que nos afastamos demais da estrada certa (na qualidade de nossa liderança, na sensação de objetivo comum, no bom senso).
"Quando se constrói uma casa é preciso uma base forte", disse Frank. "Eu olho para este país e não vejo uma base forte".
Os dois homens têm muitas memórias em comum (os cansados veteranos da Primeira Guerra Mundial em chapéus militares vendendo maçãs por um níquel nas ruas, o ano da estagnação econômica que se tornou um meio de vida, a esperança encontrada em Franklin D. Roosevelt).
"As pessoas esperavam a semana toda pelas palavras que ouviriam diante da lareira", disse Marks sobre os discursos de Roosevelt no rádio.
"Ele iluminava as pessoas, lhes dava esperança. As pessoas não perdiam aquilo por nada. Ninguém hoje em dia oferece aquele tipo de esperança."
"Hoje em dia não há esperança", disse Frank. "O presidente é um marionete. As pessoas no Congresso estão ali unicamente para salvar a si mesmas. FDR era como um Deus".
Cautela com o dinheiro
Como é comum entre a geração da Depressão, ambos os homens cuidam bem de seu dinheiro. Marks, que cresceu no Brooklyn e foi trabalhar como fiscal do serviço alfandegário da época, usou (pouco) um único cartão de crédito nos últimos 30 ou 40 anos. Ele dirige um Chevrolet Caprice por cerca de oito anos antes de comprar outro carro.
"Eu não terei o que não posso pagar", disse Frank, que foi dono de uma gráfica responsável pela criação de relatórios fiscais. "Eu não vou comprar um Cadillac se posso pagar apenas por um Ford. Hoje em dia, eu conheço pessoas que têm uma dúzia de cartões de crédito e usam um ou outro como se estão jogando cartas."
Aos 90 ou 30 anos, todos nos assustamos com a crise financeira atual.
Por isso, Marks e Frank debatiam quão grave seria essa situação e se o plano de resgate do governo funcionará ou não.
Marks disse acreditar que o plano pode evitar um desastre como o de 1929, mas que não resolverá o desemprego, a terceirização da atividade econômica, a queda do estilo de vida americano que ele vê no país.
Frank relatou a quebra entre as famílias. Naquela época, ele disse, um irmão iniciava um negócio e os outros ajudavam. Hoje, segundo ele, um está em Nova York, o outro em Chicago e o outro na Califórnia.
"Eu não acho que isso seja verdade", disse Marks. "Nós somos um país abençoado com uma enorme riqueza natural, florestas e água mineral fresca. Nossa agricultura já foi a melhor do mundo, mas as coisas não são mais assim."
"Nós ensinamos outras pessoas no mundo e agora elas são tão eficientes como a gente, ou melhores", ele acrescentou. "Algumas trabalham mais. Nós não precisamos viver uma Depressão para ver que alguns países estão crescendo e nós estamos afundando e não sabemos como mudar isso".
http://ultimosegundo.ig.com.br/new_york_times/2008/09/29/crise_financeira_revive_memorias_ruins_para_geracao_de_1929_1942865.html
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário