segunda-feira, 16 de junho de 2008

A História do canal do Panamá

Lembrem-se bem da história do Panamá e da Colômbia, para não verem a história repetida aqui no Brasil.


Em 1904 o presidente dos EUA, Theodore Roosevelt, enunciou o Corolário à Doutrina Monroe, que permitia aos EUA intervir em qualquer local no Hemisfério Ocidental para impedir a intervenção de potências europeias.

Em 1903, os EUA planearam construir o Canal do Panamá por razões estratégicas, militares e comerciais. O Panamá era uma província do norte da Colômbia. Mas a Colômbia não apoiou o plano dos EUA para criar um canal em território colombiano, território que os EUA iriam ocupar e governar indefinidamente. A forma como o governo americano contornou este problema foi enviar fuzileiros americanos para a Colômbia para cozinhar a "independência" da província do Panamá. O governo estado-unidense encenou uma "revolução" de um dia orientada por si e que resultou numa declaração de "independência" imediatamente reconhecida pelos EUA. Logo a seguir os EUA instalaram um regime sustentado por Washington na nova nação independente do Panamá.

Os EUA andavam a planear a construção do Canal do Panamá desde a guerra hispano-americana de 1898 como um projecto de construção vital para os interesses geopolíticos, militares e comerciais do país. O plano era construir o canal em território colombiano, na província norte do Panamá. Na sequência da guerra hispano-americana, os EUA emergiram como uma potência global colonial e imperialista, juntando-se às outras potências colonialistas europeias ou impérios, a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha e a Rússia. Depois desta "magnífica guerrazinha" os EUA retiraram Cuba, as Filipinas, Guam, e Porto Rico à Espanha. Os EUA anexaram estes territórios espanhóis pela força das armas e transformaram-nos em "possessões" americanas ou colónias.

O pretenso Canal do Panamá era considerado essencial para o aparecimento dos EUA como potência imperialista global. O Canal permitiria à marinha americana passar do Atlântico para o Pacífico sem ter que dar a volta à América do Sul. O Canal era vital numa perspectiva militar e estratégica, e também comercial. Foram propostas duas rotas, um canal através da Nicarágua ou através do Panamá. Os apoiantes da rota do Panamá conseguiram ver aprovado o seu plano. O passo seguinte era obter a autorização da Colômbia para construir o canal através do território colombiano, na província norte do Panamá.

O secretário de Estado americano, John Hay, e o ministro dos Estrangeiros da Colômbia, Tomas Herran, assinaram um tratado autorizando os EUA a construir o canal. A Colômbia receberia 10 milhões de dólares e pagamentos anuais de 250 mil dólares pela utilização do terreno. O Congresso dos EUA ratificou o Tratado em 17 de Março de 1903. Mas em 12 de Agosto de 1903 o Congresso da Colômbia rejeitou o tratado por unanimidade. A violação da soberania colombiana foi uma questão fundamental para a oposição a este plano.

Os EUA tinham diversas opções. Podiam construir um canal no local alternativo na Nicarágua. Podiam tentar renegociar o acordo com a Colômbia. Podiam ocupar ou apoderar-se do Panamá com base no tratado de 1847 assinado pelos EUA e por Granada (precursor da Colômbia) que dava aos EUA o direito de passagem pelo Panamá.

Havia ainda outra opção mais subtil e mistificadora. Foi a opção escolhida. Tratava-se de cozinhar a "independência" do Panamá e conseguir a separação da província através de força superior. O jornal Indianapolis Sentinel chegou mesmo a debater cinicamente a opção da independência, em 1903: "O plano mais simples para forçar a Colômbia seria incitar uma revolução no Panamá… e apoiar o governo insurrecto… É uma hipocrisia, mas mantém as aparências".

Em Maio de 1903, a "independência" ou seja a separação ou desmembramento do Panamá da Colômbia já estava a ser encarada como uma possibilidade se a Colômbia rejeitasse o acordo do canal com os EUA. Os separatistas eram chefiados por Manuel Amador Guerrero, conhecido por Dr. Amador, um médico que trabalhava na Railroad Company, que foi a Nova Iorque para coordenar a estratégia de independência ou separação com funcionários governamentais e empresariais dos EUA. Exigiu aos EUA 6 milhões de dólares para armar os separatistas. As discussões foram feitas com William Cromwell, que era um dos patronos do projecto da construção do Canal do Panamá. Philippe Bunau-Varilla, um engenheiro francês envolvido no projecto do canal, que iria arranjar 100 mil dólares para os separatistas para financiar a "independência", foi o intermediário entre o governo dos EUA e os conspiradores panamenhos. Os divisionistas tinham ligações com a Panama Railroad e a New Panama Company que eram propriedade do governo americano.

O presidente Theodore Roosevelt considerava o canal do interesse vital para os EUA. Ameaçou os dirigentes colombianos: "Essas desprezíveis criaturinhas em Bogotá têm que compreender que estão a criar uma situação arriscada e a pôr em perigo o seu próprio futuro". O embaixador americano na Colômbia, Arthur M. Beuapre ameaçou igualmente o governo de Bogotá: "O nosso Congresso irá dar passos no próximo Inverno que todos os amigos da Colômbia lamentarão tristemente".

Então os EUA escolheram a opção da "independência". Entre 12 de Agosto e 15 de Outubro de 1903, foi coordenado o plano com os separatistas panamenhos. Os EUA dariam luz verde aos separatistas e secessionistas para se apoderarem do território panamenho que os militares americanos iriam ocupar. Os separatistas criados pelos EUA declarariam depois a independência unilateralmente. Os EUA reconheceriam essa independência. A Colômbia não poderia fazer nada para impedir a amputação ou separação do Panamá.

Em 26 de Outubro, os EUA enviaram dois vasos de Guerra para o Panamá, os USS Nashville e Dixie, que atracaram em Cólon, com 450 fuzileiros a bordo, preparados para a guerra e um conflito armado com a Colômbia. No Pacífico, foram posicionados os vasos de guerra americanos Marblehead e Boston. O objectivo era evitar que a marinha colombiana impedisse a conquista do Panamá pelos EUA e pelos seus lacaios panamenhos. Foi uma situação de "diplomacia à boca das espingardas". Ironicamente, o Nashville tinha sido utilizado para dominar a rebelião ou movimento de independência filipino em 1900 e a rebelião boxer, uma rebelião chinesa para conseguir a independência da ocupação e exploração colonial e imperialista europeia.

A 2 de Novembro de 1903, foi posicionado no Panamá o navio colombiano Cartagena. Mas o navio americano Nashville, com as suas canhoneiras de 4 polegadas, conseguiu forçar o barco a recuar. A guarnição colombiana no Panamá foi subornada pelas forças americanas para não intervir. No dia seguinte o Panamá declarou a independência. Os EUA reconheceram imediatamente a independência do Panamá. Agora já podiam construir o Canal do Panamá. Voilà! Foi assim que nasceu uma nação.

Duas semanas depois da independência, a nova nação "independente" do Panamá assinou um tratado com os EUA que autorizava o projecto do canal. Os EUA tinham o direito de controlar o território panamenho em volta do canal "perpetuamente". Os 10 milhões de dólares e os pagamentos anuais de 250 mil dólares eram dados ao Panamá ao invés da Colômbia. Os EUA treinaram as forças armadas panamenhas e os administradores civis. O dólar passou a ser a divisa oficial. Até já estavam prontas uma bandeira e uma constituição. Bunau-Varilla, embora cidadão francês, foi nomeado embaixador do Panamá nos EUA. A primeira bandeira do Panamá foi concebida e costurada à mão em Highland Falls, Nova Iorque, num tecido adquirido nos Armazéns Macy. A bandeira era semelhante à bandeira do estado do Texas, vermelha, branca e azul, com duas estrelas.

Em 1921 a Colômbia foi forçada a reconhecer a independência da sua antiga província. Os EUA pagaram à Colômbia 21 milhões de dólares em troca desse reconhecimento. O Panamá iria ser governado por juntas, a militar e a da ditadura, durante a maior parte do século XX. Em 1989, os EUA depuseram o ditador Manuel Noriega, que desde 1959 era um trunfo da CIA.

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