Araguaia VI - fatores de fraqueza da guerrilha
Louis Aragon, poeta oficial do Partido Comunista Francês, ao verificar o desmoronamento do socialismo real, simplesmente constatou: “Perdi meu tempo”.
Segundo Ângelo Arroio (“Joaquim”), um dos membros da "Comissão Militar” que dirigiu a Guerrilha do Araguaia, assinala em seu Relatório à Comissão Executiva Nacional do Partido Comunista do Brasil, a referida “Comissão Militar” viu-se envolvida em três tipos de fraquezas que contribuíram decisivamente para a derrota.
Lamenta, em partes desse Relatório, essas deficiências mas, pelo que se sabe, a “Comissão Militar” não tomou nenhuma iniciativa objetivando saná-las ou diminuir os seus impactos negativos. É de se supor que a falta dessa iniciativa tenha sido decorrente do seu envolvimento, e dos Destacamentos, na luta para livrar-se da perseguição que lhes foi movida pelo contra-rebelde.
As três deficiências assinaladas foram: falta de comunicação entre os guerrilheiros e entre a guerrilha e o partido; falta de informações sobre o contra-rebelde; e deficiência de armamento, pois o que possuíam era obsoleto e com baixo poder de fogo.
Analisemos essas deficiências.
1 – Comunicações
Nenhuma guerra moderna, seja ela regular ou irregular, pode prescindir de um eficiente serviço de comunicações, pois através dele é que são dinamizadas todas as atividades do comando, bem como a pronta resposta quando do desenvolvimento das operações.
A complexidade de um sistema de comunicações depende da grandeza da luta que está sendo ou virá a ser travada, bem como do efetivo de pessoal empregado nas ações. E sua sofisticação deverá atender ao requintado sistema de armas utilizado. Como exemplo, pode ser citada a ação punitiva dos EUA contra o Iraque, denominada “Tempestade no Deserto”, no início dos anos 90, quando nas operações foi utilizado o mais sofisticado sistema de armas que até então se tinha notícia.
Na guerra irregular, quer seja a guerrilha na selva ou na montanha, o sistema de comunicações do contra-rebelde não necessita, necessariamente, ser sofisticado mas sim eficiente, e dependerá em muito das condições do terreno para que as intercomunicações sejam realizadas com a eficiência desejada e necessária.
O rebelde, por ter suas forças distribuídas na ampla região do conflito, deve possuir um sistema básico, utilizando equipamentos portáteis de fácil manejo e transporte individual, capazes de permitir as comunicações comando-bases-comando, que possibilitem direcionar as diferentes ações de forma a desgastar o contra-rebelde com um mínimo de prejuízo para si.
No caso da guerrilha urbana, o rebelde montou um sistema de comunicações por demais criativo, utilizando telefones comerciais para efetuar contatos pré-determinados, e fazendo sempre as ligações a partir de telefones públicos não suspeitos de uma possível censura. Foram utilizados, também, anúncios colocados em jornais, em datas previamente combinadas, de forma a estabelecer ou restabelecer ligações, trocar mensagens codificadas e marcar encontros, denominados por eles de “pontos”.
A marcação de “pontos” entre militantes, mormente nas áreas urbanas, envolvia todo um sofisticado sistema de segurança, com alternativas em horários seguintes, caso, por qualquer motivo, um deles não pudesse comparecer ao local à hora aprazada. Nesse caso, a última alternativa era denominada “ponto de polícia”. O militante faltoso, caso houvesse sido preso, pressionado no interrogatório, “confessaria” à polícia esse seu encontro e seria conduzido até ele. O seu contato, observando o local à hora aprazada, normalmente à bordo de um transporte coletivo, ao divisar seu companheiro, saberia que ele havia sido preso e alertaria todos seus demais contatos, bem como a Organização.
Não foi fácil à chamada “repressão” neutralizar esse sistema de comunicações, que dependia em muito dos conhecimentos sobre a Organização e de uma espécie de instinto dos membros da Inteligência. E isso só se tornou possível após meses de prática.
Quando foi iniciada a ação das Forças Armadas no Bico do Papagaio, na Selva Amazônica contra a guerrilha do Partido Comunista do Brasil, cada uma das forças singulares possuía sistemas de comando e controle independentes, confiáveis e sem nenhuma sofisticação.
Por outro lado, as comunicações dos rebeldes eram caóticas. Praticamente só existiam comunicações esporádicas, via estafeta, em contatos pessoais entre os guerrilheiros ou da guerrilha para o exterior, com o partido. Com o decorrer das operações e o progressivo cerco do contra-rebelde ao partido, nas cidades, e aos guerrilheiros, na selva, essa situação de caos se agravou e o contato guerrilha/partido/guerrilha, ao que se sabe, cessou.
Essa tática do contra-rebelde isolou a “Comissão Militar” dentro da selva, deixando-a sem saber o que ocorria com o partido e, muitas vezes, com seus próprios Destacamentos. Somente através das transmissões em português da Rádio Tirana, da Albânia, dirigidas ao Brasil, parece ter sido possível captar alguma notícia exterior à área.
A “Comissão Militar” teria sido compelida, portanto, após muitas indecisões, a baixar suas próprias orientações aos Destacamentos, deixando de saber, ou tendo extrema dificuldade em saber, como essas orientações estariam sendo cumpridas, bem como o resultado delas. Isso é taticamente mortal para qualquer movimento guerrilheiro.
Como eram realizadas, então, as ligações entre a “Comissão Militar” e seus Destacamentos e, destes, com seus grupos e vice-versa?
Era utilizado o sistema medieval de “pontos” pré-combinados, no meio da selva, para efetuar contatos. Esses contatos levavam dias e até mesmo meses para serem feitos e, se uma das partes não comparecesse ao local aprazado, mais dias poderiam decorrer até o contato alternativo seguinte. Nesse ínterim, quase sempre, a situação tática, eminentemente dinâmica, já se havia alterado.
Nesse contexto, cabe uma pergunta: pode um movimento guerrilheiro manter-se sem um imprescindível sistema de comunicações que lhe permita um mínimo de flexibilidade e mobilidade com segurança?
Não. O que ocorreu com a tal “Comissão Militar” que, por absoluta falta de condições perdeu os contatos com seus Destacamentos, poderia ter levado à decisão extrema de unificação ou dispersão de suas forças, considerando que a guerrilha estava sendo batida e encurralada pelo contra-rebelde. Essa decisão de unificar ou dispersar ao que se sabe nunca chegou a ser efetivada.
“Joaquim”, membro da dita “Comissão Militar” afirma, em seu relatório à Comissão Executiva Nacional do PC do B – um dos documentos apreendidos em 16 de dezembro de 1976 quando de uma reunião do Comitê Central do partido, em São Paulo -: “A luta do Araguaia ressentiu-se, desde o início, de sérias deficiências; em ausência de canais de comunicação, o que criou muitas dificuldades no desenvolvimento da ação guerrilheira, visto que o sistema de comunicações internas baseava-se, quase sempre, no mensageiro a pé”.
Considerando que a “Comissão Militar” tinha como um dos seus objetivos permanecer na área sem grandes perdas e realizando ações de fustigamento e emboscadas, retirando-se, em seguida a cada uma delas, para seus refúgios, na mata, visando proteger-se das ações do contra-rebelde, um sistema de comunicações via rádio, por mais simples que fosse para orientar suas manobras, tornava-se imprescindível. Teria, certamente, permitido uma sobrevida à guerrilha.
2 – Inteligência
Na guerra de guerrilhas, onde um dos lados é o rebelde e o outro o contra-rebelde, não são válidas as Leis da Guerra. Nesse tipo de guerra irregular, a Inteligência e o apoio da população são essenciais.
As Forças Armadas, ao se depararem com o trabalho de campo - “embrião da guerra popular prolongada”, segundo a versão chinesa transmitida ao PC do B -, evidentemente que teriam necessidade de realizar um paciente trabalho de Inteligência, objetivando uma das máximas de Sun-Tzu: conhecer o inimigo, o apoio que dispunha da população local, suas bases e áreas de operação, buscando levantar seus fatores de força e de fraqueza. Isso considerando que os primeiros guerrilheiros já se encontravam no local há 6 anos.
O mestre Sun-Tzu, já citado, no ano 500 A.C. escreveu o livro “A Arte da Guerra”, que contém valiosos ensinamentos sobre a Inteligência e a Guerra Psicológica. Esses ensinamentos até hoje mantêm-se válidos.
No que diz respeito à Inteligência, escreveu Sun-Tzu: “Se conheceres o inimigo como a ti mesmo, não deverás temer o resultado de 100 batalhas; se conheceres a ti mesmo e não conheceres o inimigo, a cada vitória corresponderá uma derrota; e se não conheceres a ti mesmo e nem o inimigo, serás sempre derrotado”.
Se, pelo menos algum dos jurássicos integrantes da Comissão Executiva Nacional do PC do B, tivesse, alguma vez, lido Sun-Tzu, teria aprendido que não se faz uma guerra sem Inteligência, e que insistir nesse erro conduziria ao inevitável fracasso. No entanto, na época, preferiram seguir Mao-Tsetung.
Sabendo-se que, doutrinariamente, nenhum movimento guerrilheiro pode prosperar ou sequer sobreviver sem um mínimo de apoio logístico, o contra-rebelde logo teria optado por uma ação repressiva para desmantelar o partido nas cidades, objetivando isolar a guerrilha do partido e este dela.
Custa a acreditar que um partido, cujo objetivo é a tomada do poder utilizando todas as formas de luta, desconheça os rudimentos da arte da guerra, desencadeando uma tentativa de guerra popular sem Inteligência e sem apoio popular, levando seus militantes à morte.
É correto acreditar que os militantes que receberam treinamento na Academia Militar de Pequim tenham sido instruídos e capacitados em como realizar a montagem de uma rede de informantes, como obter os informes sobre o inimigo, e como disseminá-los ao órgão de decisão para que este pudesse definir, a cada momento, os elementos essenciais de informação e adotar decisões para ações futuras.
Nos dois anos - 1972/1974 - também o partido, fora da chamada Área Estratégica, não teria realizado nenhum trabalho de Inteligência em proveito da “Comissão Militar” e da guerrilha, a não ser os informes visivelmente baluartistas remetidos à Rádio Tirana, para divulgação.
À Comissão Executiva Nacional do partido, braço político ao qual se subordinava a “Comissão Militar” que dirigia a guerrilha, caberia tratar das informações estratégicas, abordando todos os aspectos do Poder Nacional, a fim de que pudesse avaliar seus fatores de força e de fraqueza. Todavia, pelo que se pode constatar dos relatórios emitidos pelo partido em relação à guerrilha, as análises sempre foram distorcidas, pois os dirigentes máximos possuíam uma visão obtusa da realidade nacional e do próprio partido que dirigiam. Uma visão obtusa das chamadas “condições objetivas e subjetivas”.
Poderia a “Comissão Militar” estruturar uma rede de informantes objetivando produzir informações táticas sobre o contra-rebelde, ainda que rudimentares?
Sim. Caso seus integrantes tivessem clarividência e um mínimo de mentalidade de Inteligência para saber que, na guerrilha, o homem voltado para a Inteligência é mais importante que aquele que empunha uma arma.
Nos seis anos que antecederam a descoberta da área estratégica, houve tempo para fixar militantes descaracterizados junto ao povo, nas localidades e em pontos considerados estratégicos. Isso parece não ter sido feito. A “Comissão Militar” confiou apenas, para isso, “na massa”. Muito pouco. Para que resultados fossem obtidos, “a massa” teria que estar motivada. Realmente, “a massa” às vezes informou, mas sem nenhum critério. Mesmo assim, quando esses informes, de natureza eminentemente tática, chegavam ao conhecimento da “Comissão Militar”, ou mesmo aos comandantes dos Destacamentos, evidentemente que já estavam com sua validade depreciada pelo tempo, por ausência de Comunicações. Não é demais supor que o contra-rebelde tenha utilizado essa rede de informantes para fazer chegar aos rebeldes informes fabricados pela Contra-Inteligência.
Em uma área conflagrada, como era o caso da “Área Estratégica” escolhida pelo PC do B, totalmente dominada pela selva, sem que a guerrilha dispusesse de transceptores móveis e vendo-se forçada à utilização de estafetas para realizar a transmissão de informes, estes trariam pouco ou quase nenhum efeito benéfico à “Comissão Militar”, pois, doutrinariamente, um informe tático, numa situação de combate, sofre uma depreciação de 10% ao dia. Basta recordar que os contatos da “Comissão Militar” com o Destacamento C – ao qual pertencia José Genoino, atacado em abril de 1972 – teriam sido precariamente reatados em janeiro de 1973. Cerca de 240 dias depois!
O camarada Ângelo Arroio (“Joaquim”), em seu relatório, referiu que a guerrilha possuía apenas uma débil rede de informações, que provinham unicamente “da massa”. E quem era “a massa” para sequer imaginar o que interessava ou não à guerrilha saber? Uma população pobre, despolitizada e em sua maioria analfabeta.
O camarada “Joaquim” como membro da alta direção do partido e da “Comissão Militar” que dirigia a guerrilha, não teve, como se constata de seu relatório, qualquer tipo de iniciativa para corrigir esse erro de total ausência de Inteligência. Mesmo depois de abril de 1972, essa falha poderia ter sido corrigida, uma vez que a guerrilha sempre propalou que “a massa” a apoiava.
Ao tecer críticas candentes às iniciativas e às faltas de iniciativas da ”Comissão Militar”, à qual ele pertencia, Arroio criticava a si próprio. É assombroso que ele, em seu relatório, tenha se reportado como se nada tivesse a ver com a direção da Guerrilha do Araguaia. Como se fosse um simples espectador dos fatos.
3 – Armamento
Seria intenção da “Comissão Militar” obter armamento de melhor qualidade realizando ações de fustigamento e emboscadas ao contra-rebelde. Todavia, as pouquíssimas emboscadas realizadas nesse sentido, surtiram quase nenhum efeito, pois os militares estavam preparados para retaliar esse tipo de ação, e o poder de fogo de seu armamento era superior ao da guerrilha.
Segundo foi divulgado, uma única vez os guerrilheiros conseguiram êxito na obtenção de armas do contra-rebelde. Foi em uma ação realizada contra um posto da Polícia Militar do Pará na rodovia Transamazônica.
Ângelo Arroio diz no final de seu relatório: “É preciso armar-se à custa do inimigo. Os guerrilheiros precisam dispor de boas armas e estas só se conseguirão, em número suficiente, tomando do inimigo. As ações com esse objetivo têm caráter prioritário. Exigem planificação de golpes de surpresa, próximos ou distantes, que assegurem o botim indispensável. Mas é preciso também dar o máximo de atenção à fabricação caseira de minas e granadas e estudar as mais diferentes modalidades de armadilhas contra o inimigo”.
A guerrilheira “Lena”, que desertou em julho de 1972, demonstrou possuir uma visão mais clara sobre o assunto, ao observar que com o armamento que possuía a guerrilha não teria a mínima condição de enfrentar a tropa do Exército. E sobre o apoio da população local à guerrilha, “Lena” foi mais enfática: “O nosso isolamento já era claro (em julho de 1972). Sem apoio do povo você não faz porra nenhuma” (página 474 do livro “Mulheres que Foram à Luta Armada”).
A Ângelo Arroio, à Comissão Executiva Nacional do PC do B - pois pelo modelo ortodoxo a guerrilha está subordinada ao aparelho partidário - e à “Comissão Militar”, faltaram conhecimentos históricos sobre os inúmeros movimentos guerrilheiros de esquerda surgidos após a 2ª Guerra Mundial. Por mais débeis que tenham sido esses movimentos os guerrilheiros sempre estiveram bem armados e com grande poder de fogo, como era o armamento de procedência soviética. Sempre dispuseram, assim, de meios para realizar com êxito as tais emboscadas e fustigamentos a que o Sr. Arroio enfaticamente se referiu em seu Relatório.
Resta uma última pergunta: o que fizeram o partido e a “Comissão Militar” nos seis anos (1966-1972) de preparação da Guerrilha do Araguaia? Essa é a pergunta que os militantes do partido e os familiares dos que morreram no Araguaia não obtiveram resposta nestes 30 anos.
http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=1518
Análise Sobre a Guerrilha do Araguaia(1N)
Partido Comunista do Brasil (PC do B)
"Camaradas
Na ultima reunião do CC foi apresentado um relato objetivo do trabalho de preparação da luta armada em varias regiões do BRASIL, após a reorganização do Partido. Deu-se particular atenção aos preparativos, desencadeamento e desenvolvimento da resistência armada no ARAGUAIA. Nesta reunião, se discutira essa experiência.
A guerrilha no Sul do PARÁ sobrevive há mais de 3 anos. Nenhuma luta com esse caráter em nosso país sustentou-se durante tanto tempo. As tentativas depois do golpe de 1964 fracassaram em poucos dias. É o caso do levante do Coronel CARDIM, no RIO GRANDE DO SUL, a preparação armada na Serra do CAPARAÓ , a guerrilha do VALE DA (sic) RIBEIRA, a guerrilha urbana dirigida por MARIGHELA , etc.
Importância Política da Luta no Araguaia
A resistência armada no ARAGUAIA verificou-se quando a ditadura já imperava há oito anos no pais. Na época, os militares consideravam como liquidada a oposição ao regime fascista. Acendeu-se então uma chama que ilumina a estrada que deve ser trilhada pelo nosso povo na busca de sua libertação. Este exemplo é um poderoso estímulo para todos os patriotas e revolucionários. O PC do BRASIL, a frente dessa luta, coloca-se como a força mais conseqüente na luta contra a ditadura. Com isto aumenta seu prestígio no seio das correntes progressistas do país e no exterior.
Fato político a assinalar é que na área onde se desenvolve a luta guerrilheira, mais de 90% da população passou a apoiar os combatentes do povo. A principio, Apoio Moral. A massa mostrava-se simpática aos guerrilheiros, apesar de todo o trabalho realizado pelo inimigo com o objetivo de amedronta-la e enganá-la. A seguir, a ajuda passou a ser mais ativa. Além dos alimentos, auxilio na transmissão de informações e na aquisição de objetos necessários. Era comum, a massa colocar sua roça a disposição dos guerrilheiros. Sua integração com os guerrilheiros cresceu a tal ponto que estes realizavam trabalho produtivo junto com os moradores em suas roças. Populares faziam propaganda da guerrilha. O povo local to- [LACUNA NA REPRODUÇÃO DO ORIGINAL]
combatentes. Numa fase mais adiantada da luta, organizaram-se núcleos da ULDP(2N) alguns posseiros ingressam nas forças guerrilheiras e cerca de 40 elementos haviam se comprometido a isto fazer quando os militares iniciassem a 3a, campanha. Nove participam de ações guerrilheiras sem pertencer aos Destacamentos.
"O povo mata" uniu em torno de si pessoas de todas as crenças e camadas sociais; católicos, crentes, terecozeiros, posseiros pobres, camponeses médios, comerciantes, alguns fazendeiros e mesmo donos de castanhais, A luta elevou a consciência política das massas, ajudou-a a ver quem são seus amigos e seus inimigos, despertou-a para as causas da situação de miséria em que vive. A ditadura não conseguiu mobilizar e organizar o povo no combate à guerrilha. Tiveram imensas dificuldades em conseguir guias. Todas as tentativas de ganhar as massas com o ... INCRA e Operações Aciso(3N) fracassaram.
Foi, portanto, no terreno político, fundamentalmente no trabalho de massas, que residiu o êxito principal da resistência armada no Sul do PARA.
Constitui fato relevante a guerrilha ter resistido longo período, apesar do Exército ter realizado três campanhas militares, empregando cerca do 20 mil homens. Os Destacamentos armados fizeram algumas ações militares que tiveram grande repercussão política na região. Conseguiram algumas armas, provisões e liquidaram soldados e bate-paus.
No ARAGUAIA forjaram-se verdadeiros revolucionários. A alta consciência política, as dificuldades da luta, fizeram surgir combatentes firmas, Leais ao Partido e ao Povo, dispostos aos maiores sacrifícios. Com raras exceções, quase todos avançaram na sua formação revolucionária, dando exemplos de coragem, abnegação, firmeza e disciplina. O ARAGUAIA constituiu-se numa escola de quadros. Destaque especial merecem as mulheres que em todas as tarefas se igualavam aos homens. Os que ali tombaram são mártires da luta para que o nosso povo tenha um futuro mais feliz. Cumpriram com honra seu dever de comunistas. Os que ainda mantém a chama acesa da luta no ARAGUAIA merecem a nossa grande admiração, respeito, solidariedade proletária.
Grande importância política teve a luta do ARAGUAIA no conjunto do país. Ela é inseparável do esforço de nosso povo para se ver livre da ditadura. Como forma mais alta de luta, onde se torna conhecida, ganha adeptos e é saudada com entusiasmo. Pode-se considera-la como um golpe potente sobre o regime dos militares fascistas.
Também no exterior, a resistência armada teve uma grande repercussão. Foi encarada como parte da grande luta dos povos oprimidos por sua verdadeira eman- [LACUNA NA REPRODUÇÃO DO ORIGINAL]
O Que Nos Ensino o Araguaia
Camaradas. O ARAGUAIA, qualquer que seja a sua sorte, traz inúmeros ensinamentos para o nosso povo e para o nosso Partido que é a sua vanguarda. Durante a luta tivemos êxitos significativos e também erros e deficiências. Até o início da 3a. campanha já havíamos notado diversas falhas, embora, no conjunto, fosse bastante positivo os resultados alcançados. Os insucessos mais graves ocorreram no curso da 3a. campanha. Sofremos uma derrota temporária. Devemos aqui fazer um exame crítico e autocrítico de toda a nossa atuação no ARAGUAIA, aprender com as experiências tanto positivas como negativas. A discussão se faz baseada numa experiência vivida. Entretanto, os dados que temos referem-se ao período que vai até janeiro de 1974. De lá para cá, as informações que possuímos são precárias. Não sabemos qual foi a conseqüência do ataque do inimigo sobre o acampamento em que se encontrava a CM(4N) e elementos de dois destacamentos, o B e o C, ataque realizado em 25 de dezembro de 1973. Tampouco sabemos como reagiu a massa diante da ofensiva do Exército. As notícias recentes dizem que o Exército continua na área realizando operações antiguerrilha. E o General Geisel, em março, tornou pública a existência das guerrilhas de MARABÁ-XIMBIOÁ. Deduzimos, pelo que sabemos, que a luta continua, apesar dos sérios golpes que sofremos.
A luta no Sul do PARÁ iniciou-se por iniciativa do inimigo. As Forças Guerrilheiras ainda não haviam terminado sua preparação em todos os terrenos, quando foram atacadas. Diante da agressão, tínhamos duas opções: a) abandonar a área; b) resistir de armas nas mãos. Preferiu-se a segunda pelo fato de que já havia um mínimo de preparação e a luta se iniciava politicamente de maneira favorável. Os resistentes apareciam como vítimas da violência da ditadura e os militares apresentavam-se perante o povo com sua verdadeira face de instrumento dos mais poderosos e do regime fascista.,
Por que a luta armada no ARAGUAIA manteve-se acesa durante os vinte primeiros meses? Por que ganhou o apoio de mais de 90% da população? Isto foi possível por uma série de fatores dos quais destacamos os seguintes:
1 - INTEGRAÇÃO COM AS MASSAS
Realizou-se um bom trabalho de integração com os moradores da região. Os guerrilheiros não eram estranhos ao povo, não caíram de paraquedas. Alguns viviam lá há uns 6 ou 7 anos. Os laços de amizade entre os combatentes e as massas eram estreitos, Efetuou-se um trabalho de servir o povo através de atividades de assistência médica, farmacêutica, dentária, alfabetização, comércio, trabalho produtivo em comum, visitas, etc. O trabalho político não era aberto antes de começar a luta e se o fosse não há dúvida de que sofreríamos golpes antes de nos firmar na área. A maioria da população conhecia bem os nossos camaradas os quais eram respeitados e queridos pelo povo. Por isso, a ditadura não conseguiu mobilizar as massas contra os guerrilheiros.
2 - ORIENTAÇÃO POLÍTICA CORRETA
A orientação política foi certa desde o período da preparação, inicio e desenvolvimento da luta armada. Baseava-se na orientação programática, e tática do Partido e que se expressava, na região, no documento "EM DEFESA DO POVO POBRE E PELO PROGRESSO DO INTERIOR". O conflito armado apresentou-se como resistência dos moradores às arbitrariedades do Exército. O povo era vitima da ação militar e apelava para as armas como o único recurso para defender seus direitos. O comunicado nº. 1 das FF.GG, esclarece às massas sobre o motivo da luta, seus objetivos e apela para que estas se unam, se organizem e enfrentem o inimigo. Toda a propaganda verbal e escrita concentrava-se no ataque à ditadura militar, contra os grileiros e também contra os imperialistas norte-americanos. Ligou-se a luta pelas reivindicações locais com a luta pelas reivindicações nacio- Denunciou-se as manobras do INCRA, da Operação ACISO, a venda de grandes extensões de terra aos americanos, a entrega do minério da Serra dos CARAJÁS, etc. Nas relações com as massas, respeitávamos seus costumes e suas crenças, não se discutia religião e se tomava parte nas suas sessões de rezas, respeitávamos as mulheres e as filhas dos camponeses, tudo que se comprava se pagava. Essa nossa conduta nos distinguia, dos militares que, por onde passavam, cometiam as maiores brutalidades. Nossa política foi uma política de massas, que se apoiava no princípio de unir todos os que possam ser unidos, neutralizar os que possam ser neutralizados, e atacar os que devem ser atacados. O resultado dessa orientação correta foi a criação de uma base política na região, embora elementar, o ingresso de elementos de massa na guerrilha, a organização de núcleos da ULDP e o apoio de mais de 90% dos moradores.
3 - A REGIÃO BEM ESCOLHIDA
A região escolhida para se preparar e desencadear a luta armada era boa, do ponto de vista de massa, mata e recursos naturais. Houve uma justa combinação do fator mata e massa. A população é constituída por posseiros, sendo que mais de 80% era gente pobre. Alguns vieram para ali, expulsos de outras regiões. Embora fosse uma população politicamente atrazada, odiava os grileiros, a polícia e procurava ter a sua terra. Potencialmente é uma massa favorável à Revolução democrática e antiimperialista. Na área e na periferia ocorriam choques com os grileiros, por motivo de terras. A densidade populacional era regular, incluindo-se a periferia. As maiores concentrações estão na beira do ARAGUAIA, diminuindo à medida em que dela se afasta para o interior da mata. A região liga-se com GOIÁS e MARANHÃO, também com MATO GROSSO, podendo por isso ecoar nesses Estados a luta travada no ARAGUAIA. É toda coberta de mata. Esta foi um aliado poderoso da guerrilha, sobretudo na primeira e segunda campanhas. A área tinha poucas estradas, muita caça, frutos, palmito e era auto suficiente em produtos agrícolas. O fato de a guerrilha estar localizada numa área coberta de mata, com poucas estradas, com recursos naturais e alimentícios foi fator favorável a sua sobrevivência. Na fase inicial, tratando-se de uma força pequena, com pouca experiência e armas ineficientes, a mata tem enorme importância. Protege a guerrilha dos ataques aéreos, dos blindados e da artilharia. A existência de poucas estradas dificulta o cerco do inimigo.
4 - Orientação Militar, no Fundamental, Correta (Até o início da 3a. campanha).
A orientação partia do fato de que a guerrilha era uma força pequena, com pouca experiência militar, mal armada, responsável pelo único foco de luta armada no país. E o inimigo era forte militarmente. Toda a ação militar foi examinada de um ponto-de-vista político; se contribuiria ou não para maior ligação da guerrilha com as massas. Em síntese a orientação foi a seguinte: quando o inimigo entrava na zona da guerrilha, devíamos recuar e concentrar nossa força em cada Destacamento; a partir de informações concretas, adotar a linha de ação. Se o inimigo realizasse uma grande operação, devíamos ficar recuados nos refúgios. Se a operação é de menor envergadura, se devia realizar algumas ações militares e trabalho de massa. Admitimos como princípio estratégico fundamental - a sobrevivência. Esta significava não realizar ações que levassem a perda desnecessária de companheiros, evitar combates frontais, conhecer bem o terreno e ter áreas de refúgio. O principio da sobrevivência estava ligado à perspectiva de que a luta seria prolongada e que a existência de um foco armado jogava papel relevante na situação nacional. Como forma principal de luta armada, adotou-se a propaganda armada. Fez-se mais propaganda política e menos ações militares. A propaganda visava explicar às massas os objetivos da luta, elevar a sua consciência política, ganhar o seu apoio, estender a nossa influência e criar uma base política na região. A criação dessa base tinha enorme importância na ampliação da luta armada. Pode se afirmar que criamos uma base política, pois contávamos com o apoio e a imensa simpatia do povo.
5 - Preparação dos Combatentes
Os combatentes tinham uma razoável preparação política, ideológica e militar. Todos conheciam a orientação do Partido e esforçavam-se para aplica-la na região. Os documentos partidários eram discutidas, tendo-se o máximo de cuidado com a segurança. Faziam-se debates sobre problemas nacionais e internacionais. A Rádio prestou uma grande ajuda na formação política dos combatentes. O preparo ideológico era encarado como fundamental para os guerrilheiros. Na seleção do pessoal, considerava-se em primeiro lugar o aspecto ideológico. Cerca de 90% dos que foram para o ARAGUAIA comportaram-se dignamente e honraram a tarefa que receberam. Embora em sua imensa maioria não tivessem conhecimentos militares, quando lá chegaram, esforçaram-se para adquiri-los. Todos aprenderam a atirar, alguns chegaram a ser bons atiradores, aprenderam a caminhar bem na mata, a orientar-se, sobreviver, etc. O Curso Militar que foi ali elaborado e ministrado, contribuiu muito para o aperfeiçoamento do pessoal. E depois a luta ensinou mais ainda. Sem esse mínimo de preparação militar e de conhecimento do terreno, seria muito difícil enfrentar o inimigo.
6 - A Reserva de Provisões
Havia uma certa preparação logística. Ainda, que na região houvesse recursos alimentícios, organizaram-se, antes da luta, vários depósitos com medicamentos, alimentos, roupas, pólvora, etc. Isto serviu de apoio aos guerrilheiros quando foram atacados pelos militares. A guerrilha recuou para áreas de refúgio e durante algumas semanas evitou de ter que se aproximar da casa dos posseiros a procura de comida, o que seria perigoso, porque o inimigo vigiava esses locais. No desenvolvimento da luta, foram criados novos depósitos de alimentos que desempenharam importante papel. Se faltasse esse mínimo de provisão a sobrevivência da guerrilha tornar-se-ia difícil. Há momento em que a pressão do inimigo é grande, obrigando a guerrilha a sumir durante meses para escapar aos golpes do adversário. Por isso são necessários a criação de depósitos clandestinos e pontos de apoio clandestinos que ajudem no abastecimento. A luta armada no BRASIL não conta com países vizinhos amigos. Dai a necessidade de cuidar atentamente de uma rede interna de abastecimentos.
7 - Inimigo Carente de Experiência
Por ultimo, a guerrilha enfrentou nas duas primeiras campanhas, um adversário mal preparado e com pouca experiência para a luta na selva. A maioria dos soldados eram recrutas, tinham moral baixo. O Exército não dispunha de bons guias. Por isso, a sua movimentação limitava-se mais a andar nas estradas, caminhos, roças, abrindo picadas ou beirando as grotas. As informações que eles tinham sobre as nossas forças, nossa movimentação, nossas áreas de atuação e refúgios eram precárias. Tendo se retirado da área e permanecido unicamen [LACUNA NA REPRODUÇÃO DO ORIGINAL]
periferia, permitindo certa liberdade de ação dos guerrilheiros. Sem a pressão imediata do inimigo, a massa sentia-se mais confiante. A guerrilha aparecia, no local, como autoridade. Assim pôde ligar-se mais às massas e expandir sua influência.
Em linhas gerais, foram estes os fatores principais que atuaram positivamente e permitiram os êxitos alcançados pela guerrilha ate o inicio da 3a, campanha.
ERROS E DEFICIÊNCIAS
Apesar de a guerrilha ter conseguido, particularmente, entre a primeira e a terceira campanha, importantes êxitos, registraram-se também falhas, deficiên¬cias e erros que devemos analisar, os quais nos conduziam a sofrer uma derrota temporária no curso da terceira campanha.
O principal erro foi não ter expandido a base guerrilheira e sim tê-la restringido. Ter concentrado demais nossas forças ao invés de disperçá-las. Desde o início da luta era grande o numero de combatente a em relação ao terreno e a massa. Haviam cerca de 70 elementos numa extensão de 130 quilômetros por 50 de fundo. No decorrer da luta, a área foi ainda mais reduzida, em consequência das baixas sofridas pelo Destacamento "C". Este, a partir de março de 1973 aproximou-se mais da área do Destacamento B, restringindo-se assim a sua área de atuação. A partir de agosto, passou a atuar junto com o B. O Destacamento A também ficou muito tempo preso a área de FORTALEZA, quando podia ter ampliado mais seu campo de incursões. Ficou-se demasiado amarrado ao território já trabalhado politicamente. Neste já não seria necessário ficar tanta gente, uma vez que as massas nos apoiavam abertamente. Tratava-se de deixar alguns elementos para consolidar o trabalho de massas e organizar mais o povo. Outros elementos podiam deslocar-se para outras áreas tendo em vista a abertura de novas frentes guerrilheiras. Esta hipótese já vinha sendo discutida mas não foi levada à pratica. Achava-se que era necessário consolidar mais o trabalho de massa, pois muitos moradores ainda não tinham sido atingidos com a nossa propaganda. Havia também a perspectiva de que o Exército podia voltar a qualquer momento e era necessário ter o pessoal a mao. Alem disto, haviam as promessas da entrada de cerca de 40 elementos depois da volta do Exército. O deslocamento para outras áreas seria inteiramente correto, porque estenderia ainda mais nossa influencia política, nosso campo de manobra tornar-se-ia maior, obrigando o inimigo a dispersar mais suas forças.
Este erro se agravou com a decisão da CM, em novembro de 1973, de fundir os 3 destacamentos. A idéia da fusão partiu do fato de que, reunidos, os 3 teriam mais poder de fogo, melhores condições para realizar ações armadas e um comando mais
atuante a eficiente. Além disso, as forças dos Destacamentos B e C tinham-se reduzido e com as baixas sofridas. O C contava somente com 14 elementos e o B com 12 elementos. A decisão de fundir os 3 não chegou a se concretizar. Apesar disto, a CM ficou "amarrada" a essa resolução. Quando o inimigo, na 3a, campanha acossou fortemente os guerrilheiros, a CM manteve unidos os destacamentos B c C e rumou para a área de A com vista a unir toda a força. Com isto, reduziu-se enormemente a área de manobra, facilitando a perseguição do inimigo. Cometeu-se um erro tático ao manter as forças concentradas numa pequena área ao invés de dispersá-las numa grande área. Em conseqüência, no dia 25 de dezembro sofremos um sério golpe. O inimigo atacou com grande superioridade de força o agrupamento guerrilheiro de 15 elementos, onde se encontrava a CM, Não sabemos o que ocorreu com onze dos companheiros que aí estavam, inclusive três elementos da CM. Depois dessa ação, o Exército concentrou mais força na área do A, criando problemas sérios para o Destacamento que há mais de dois meses não mantinha contato com o inimigo.
É admissível a concentração de vários destacamentos para ações de maior vulto, mas esta concentração deve ser esporádica e não permanente. Naquela situação concreta, essa decisão foi incorreta. Em face da ofensiva inimiga, o certo seria a dispersão. Um grupo grande torna-se mais vulnerável, mais lento, deixa mais rastros, tem maiores dificuldades para se abastecer. Dispondo de tropas móveis e bem armados, o inimigo tem maior facilidade para obter contato com os destacamentos, particularmente seguindo os rastros, o que ocorreu varias vezes.
A experiência mostrou que, se tivéssemos ampliado mais a nossa área de atuação e dispersado nossas forças teríamos evitado ou pelo menos diminuído os golpes sofridos.
Outro erro, pode ser considerado o de não termos nos prevenido com refúgios distantes para a hipótese de ter que sair da área no caso de forte pressão inimiga. Embora tivéssemos vários refúgios dentro da área guerrilheira, não cuidamos de prepara-los em lugares bem afastados da zona onde atuávamos e que poderiam ser usados nos casos de extrema necessidade. A criação desses refúgios distantes foi discutida, mas não chegou a sex concretizada porque se acreditava que os refúgios existentes seriam suficientes. Acontece que o Exército na 3a. campanha vasculhou toda a área, inclusive as de refúgio, espalhou patrulhas em todas as direções procurando estabelecer contato com a guerrilha. Nestas condições tornou-se difícil a situação dos combatentes que ficaram sem locais seguros onde se refugiar.
Outras falhas se verificaram. Entre estas a de não termos liquidado alguns bate-paus conhecidos e expulsado da área elementos suspeitos de que para lá foram enviados pelo inimigo. Embora tivessemos liquidado três bate-paus, outros bem conhecidos; não o foram, apesar de praticamente terem estado em nossas mãos. Esses bate-paus, que conheciam muito bem a região, acabaram criando sérios problemas para nós. Eles eram guias e colaboradores efetivos do Exército. Quanto aos elementos suspeitos, eles estavam localizados dentro da área e serviriam de ponto de apoio ao inimigo. Nossa política com eles foi tolerante. Devíamos tê-los expulsados. Chegou-se a tomar ama decisão a esse respeito, mas muito tardiamente.
Consideramos também que nem sempre fizemos um justo aproveitamento dos elementos de massa na guerrilha. Houve de nossa parte precipitação em trazer para o grupo armado certos elementos que poderiam prestar maior serviço fora dos destacamentos. Podiam ter ficado, aparentemente neutros, a fim de ajudar diversos tipos de trabalho; prestariam maior colaboração na infra-estrutura, por exemplo. A luta mostrou que com uma política correta ganha-se muitos combatentes locais. É necessário tratá-los sem discriminações, levar em conta seu. nível de consciência, ajuda-los a se tornar bons combatentes em todos os sentidos. Isto aconteceu com vários elementos. Aprenderam a ler, e avançaram politicamente e ajudaram bastante com sua experiência de mata e de roça. Outros, porém, não aprovaram plenamente. É o caso de três jovens recrutados. Eles vieram no período da trégua e na base do entusiasmo. Mas diante das dificuldades, surgidas na 3a. campanha, desistiram de continuar. No Destacamento B, a deserção de um desses jovens criou sérios problemas pois conhecia a área, alguns amigos e os depósitos. Foi erro deixa-lo conhecer depósitos. Alem disto, a deserção pode repercutir mal no meio da população e ser aproveitada pelo inimigo. Há necessidade de trazer os jovens, mas convém, primeiro, conhecê-los melhor e fazê-los passar por certo estágio de preparação. Na fase mais avançada, será mais fácil a entrada sem preparação desses jovens. Mas na fase inicial, é preciso fazer melhor seleção.
A resistência armada revelou, igualmente, deficiências. Umas existiam já antes da luta; outras manifestaram-se no curso da resitência. Vejamos algumas:
1) VIGILÂNCIA E ESPÍRITO MILITAR
A maioria dos companheiros tombados na luta, morreram por falta de vigilância. Na mata, o campo de visão é pequeno, a surpresa está presente a cada momento. Na sua maior parte os choques se dão de modo repentino. Por isso, impõe-se uma aguda vigilância. Qualquer descuido, cochilo ou ruído pode significar a morte de combatentes. Quando se iniciou a 3a. campanha, perdemos 5 bons companheiros no destacamento A, por falta de vigilância, já durante a 1a, e a 2a, campanhas tínhamos perdidos vários elementos no Destacamento C pelo mesmo motivo. Nem todos os combatentes tinham a vigilância aguçada. Esta exige que o guerrilheiro esteja, sempre atento e nunca esqueça que esta em guerra e que quem é surpreendido leva desvantagens. Tivemos exemplos positivos, como o de OSVALDO e de MUNDICO que, por estarem vigilantes e atentos, liquidaram o inimigo de surpresa.
Isto se forja principalmente na luta, ainda que o treinamento ajude a adquiri-lo. Os longos períodos de trégua, em certo sentido descondiciona o combatente, se não houver constante exercício. Compreendemos que ter espírito militar é estar sempre pronto para o combate, com a arma na mão ou próxima, em condições de usar; e estar todo tempo de olhos abertos e ouvidos atentos; falar baixo e quando houver necessidade, não fazer ruído no acampamento ou quando em marcha; não deixar rastro. É obedecer imediatamente ordens do comando, ter reflexos rápidos, atirar com rapidez, andar ligeiro quando a situação exigir, e ter coragem ao enfrentar o inimigo, etc. Nossos companheiros vinham adquirindo todas estas qualidades guerrilheiras, porem, ainda faltava muito para se tornaram mais qualificados,
2) CARÊNCIA DE REDE DE INFORMAÇÕES
É sabido que o êxito das ações guerrilheiras depende de informações precisas e oportunas, A sobrevivência da guerrilha subordina-se em parte a um bom serviço de informações capaz de fornecer dados sobre o movimento e se possível dos planos do inimigo. Nossas informações eram fornecidas pela massa, de maneira esporádica. Não tínhamos uma rede de informações organizada. Na periferia somente pouco antes da 3a. campanha é que obtivemos algumas informações sobre o inimigo. A CM talvez tivesse adotado outra tática se tivesse notícias mais precisas sobre a movimentação e o numero de soldados inimigos. Pensava-se que o numero de soldados era pequeno. Atuar sem informações ou com informações tardias é o mesmo que agir no escuro, sem segurança. A experiência indicou que o serviço de informações organizado é essencial para a guerrilha. Dela muito depende a sobrevivência e seus êxitos nas ações militares.
3} REDE DE COMUNICAÇÕES
Em abril de 72, quando fomos atacados, estávamos dando os primeiros passos para a organização de uma rede de comunicações. O que existia era muito precário. Por isso, a resistência ficou sem contato com o CC durante a maior parte do tempo, e hoje sofremos as conseqüências disto. Esta falta de maior contato impediu que a guerrilha recebesse mais ajuda política e material. Havia pouco dinheiro em mãos dos combatentes. A massa ajudava com alimentos, roupas, redes, etc., mas ela é muito pobre. Na terceira campanha, havia carência de bússolas, roupas, sapatos, plásticos e alguns remédios. Esse desligamento também não permitiu que novos combatentes chegassem das cidades, os quais poderiam contribuir para ampliar mais a área da luta e preencher os lugares vazios deixados pelos que morreram. Tivemos um ano de trégua no qual poderíamos ter completado o que não foi feito na fase preparatória. Infelizmente os golpes sofridos pelo Partido nas cidades também contribuiu para isso. O contato com a direção possibilitaria a esta receber maiores informações sobre a luta, permitiria maior e melhor propaganda. De outra parte, convêm destacar que nossas comunicações internas na área eram feitas por mensageiros a pé, a cada 20 ou 25 dias havia contato entre os destacamentos e a CM. Os mensageiros levavam, ida e volta, de 4 a 8 dias. Nesses contatos havia o risco de haver choques com soldados. A demora nas comunicações dificultava o recebimento de informes valiosos e a coordenação de nossas forças. O inimigo, porem, dispunha de comunicações rápidas e eficientes, usando rádios e outros recursos. A experiência mostrou que necessitamos de meios de comunicação rápidos, eficientes e seguros, tanto internos como com o exterior. É necessário cuidar atentamente desse problema pois a tática do inimigo visa em primeiro lugar a isolar a guerrilha da massa e dos centros de sustentação. Sabe que impedindo essas comunicações, a tarefa de liquidar a guerrilha torna-se mais fácil. .
4) ARMAS E EXPLOSIVOS DEFICIENTES
Nossas armas de um modo geral não eram boas e seu poder de fogo bem pequeno. Enquanto dávamos um tiro, o inimigo podia dar 20 no mesmo tempo, O combatente com uma arma boa tem mais confiança em si. Uma boa metralhadora pode paralisar um grupo inimigo, porem, uma espingarda não. Varias vezes não se liquidou soldados por defeito da arma. O inimigo sabia que nossas armas eram precárias. Se recebessem algumas rajadas de metralhadoras, viriam com mais cuidado, tínhamos alguns fuzis e no assalto ao Posto Policial conseguimos mais seis. Eram antigos e a maior parte se perdeu na luta. A arma não é o fator decisivo, mas joga um papel importantíssimo. Vale muito mais um guerrilheiro preparado ideologicamente e armado de fuzil FAL do que com uma espingarda de cartucho. A orientação atual do Exército é atacar em resposta ao tiro que recebe e não imobilizar-se, isto porque possuem armas automáticas. A falta de explosivos, pólvora, dinamite, etc. impediu que fabricássemos minas. O uso de minas criaria sérias dificuldades ao inimigo. Tínhamos pouca pólvora, em geral, reservada para cartuchos de espingarda. Poucas foram as armas que conseguimos no curso da luta. Não pegamos uma só metralhadora.
5) O PARTIDO NA PERIFERIA
Não havia Partido no Estado de GOIÁS, PARA e no MARANHÃO, existia somente um pequeno núcleo. Durante a preparação não foram criadas organizações partidárias nas cidades periféricas da zona guerrilheira. Do ponto de vista orgânico, a guerrilha ficou isolada do conjunto do Partido. A ausência de organizações do Partido nas proximidades da área, refletiu negativamente na ampliação da luta, no terreno de massas e em todos os sentidos. A existência do Partido poderia ajudar nas informações, comunicações, esclarecimento do povo, elevação de sua consciência, política, recrutamento para a guerrilha e na abertura de outras frentes. Com um trabalho do Partido entre o povo, a ajuda deste seria maior e também a repercussão da luta na periferia. A experiência mostra que é necessário a organização do Partido nessas áreas nevrálgicas, sem a existência delas o inimigo tem mais facilidade de isolar a guerrilha, territorialmente.
Essas, cm linhas gerais, foram nossas deficiências principais e que in¬fluenciaram negativamente no desenvolvimento da luta armada no Sul do PARA.
Camaradas. Porque cometeram-se esses erros ? Quais as suas causas ? A derrota era inevitável ?
Pensamos que não era inevitável. Os golpes poderiam ter sido evitados se a CM não cometesse algumas faltas sérias. Os erros se devem, a algumas concepções falsas em nosso meio e a nossa falta de experiência militar. Houve grande subestimação do inimigo. Esta subestimação aumentou com o fracasso das duas primeiras campanhas do Exército nas quais os soldados somente andavam nas estradas, caminhos, roças ou beirando grotas, campanhas de curta duração, no período da seca. Tínhamos a compreensão de que o Exército não entraria a fundo na mata e que nesta estaríamos seguros, que não entrariam na época da chuva, que não poderiam fazer longas campanhas por dificuldades logística, que seria, muito difícil realizar o cerco, pois nosso campo de manobra era favorável. Estes pontos de vistas que avaliavam de maneira incorreta as possibilidades do inimigo, influíram na tomada de algumas medidas que a vida mostrou serem indispensáveis, conduziram ao relaxamento da vigilância e a cometer algumas facilidades. A tática empregada pelo inimigo na 3a. campanha nos surpreendeu. Alem disto, a campanha estendeu-se por todo o período das chuvas.
Houve de parte da CM certa tendência a centralização o que tolhia um pouco a iniciativa dos destacamentos. Os contatos de 20 e 25 dias amarravam demais os destacamentos à CM. A centralização é necessária, mas deve ser flexível. A nossa falta de experiência militar também nos levou a cometer erros. A resistência do ARAGUAIA foi a nossa primeira experiência prática, o nosso primeiro ensaio, e nesse sentido muitos erros são inevitáveis.
SOBRE A TÁTICA DO INIMIGO
[LACUNA NA REPRODUÇÃO DO ORIGINAL]
tatica usada pelo inimigo.
O Exército iniciou a primeira campanha atacando os pontos de apoio com pequenos efetivos. Tinha, porem, mobilizado na zona efetivos de cerca de 5 mil homens. Queimava as moradias, os paióis de arroz e milho, cortava arvores frutíferas, etc. Propagou na região que os guerrilheiros eram terroristas, assaltantes de bancos, maconheiros, cubanos, russos, etc. Montaram bases em fazendas, sedes de castanhais e nas cidades e povoados da periferia. Prenderam algumas dezenas de moradoras como suspeitos de ligação com os guerrilheiros. Soltou-os depois de alguns dias. Essa campanha durou cerca de 3 meses. Ao lado das medidas militares, proibiu a difusão de qualquer noticia sobre a luta (na imprensa, radio, televisão).
Em setembro de 72, começou a 2a. campanha. Os efetivos empregados aumentaram para cerca de 10 mil. Em sua maioria eram recrutas de vários Estados. A tropa especializada em luta na selva não era predominante. A campanha durou cerca de 3 meses. O Exército retirou-se da mata, deixando na periferia soldados do Exército da PM, em operações tipo polícia.
Levaram quase um ano preparando a nova ofensiva, a 3a. campanha. Nesse período, a ditadura lançou-se contra o Partido nas cidades, visando com isso interditar o apoio externo à guerrilha. O CC foi seriamente golpeado com a morte de 4 companheiros. Os Comités do Partido no CEARÁ, ESPÍRITO SANTO,. GUANABARA, SÃO PAULO e BAHIA foram, gravemente atingidos. Na região, o Exército intensificou o trabalho com o INCRA, procurando legalizar alguns títulos de posse e realizou Operações ACISO com o atendimento medico, dentário, distribuição de remédios gratuitos, etc, com o objetivo de ganhar apoio de massa. Prepararam tropas de combate nas selvas. Recrutaram e treinaram bons guias. Montaram infra-estrutura na periferia e iniciaram esse trabalho dentro da área. Construíram quartéis para alojar Batalhões de Infantaria da Selva nas cidades de MARABÁ., IMPERATRIZ, ITAITUBA, ALTAMIRA e HUMAITÁ. Dentro da área de guerrilha, alargaram e construíram novas estradas. Infiltraram varias pessoas na região com a cobertura de "fazendeiros", objetivando colher informações sobre a massa e as forças guerrilheiras.
Dia 7 de outubro de 73, iniciaram a 3a. campanha. Penetraram na área por S. GERALDO, SÃO DOMINGOS e TRANSAMAZÔNICA, com pouca tropa. Mantiveram na periferia alguns milhares. A seguir foi crescendo o numero de soldado deslocado para a mata. Uma das primeiras medidas que tomaram foi a prisão de centenas de moradores e, em especial, os melhores amigos dos guerrilheiros. As prisões também se estenderam nas cidades periféricas. Desta vez os presos não foram soltos. Muitos permaneceram vários meses. O Exército criou um clima de terror na região com o objetivo de amedrontar a massa, afastá-la da guerrilha, impedindo seu apoio e seu ingresso nas Forças Guerrilheiras. Obrigaram alguns moradores a servir de guia sob ameaça física. Queimaram todas as casas e paióis onde não encontraram moradores. Através do terror procuraram manter o controle sobre a população. Outra medida, foi a instalação de bases de operações dentro e fora da área. Utilizaram as antigas e criaram novas. Fala-se em 5 mil o numero de soldados mobilizados. Nas bases dispunham de helicópteros e em algumas desciam aviões. O Exército espalhou dezenas de patrulhas de combate nas selvas em todas as direções com objetivo de buscar contato com a guerrilha e conseguir informações. Armaram emboscadas nas roças, capoeiras, estradas. Evitavam andar pelas estradas. Entraram nas matas com bons rastreadores, em grupos de 10, sendo que havia também alguns bem maiores. Estavam bem armados com metralhadoras e fuzis FAL. Usavam roupa civil na mata, tenis e mochilas. Levavam ração para passar varies dias na mata, sem depender da base de operações. Empregaram em grande escala o helicóptero e o avião. Geralmente, os dois tipos de aparelhos operavam juntos e coordenados com as forças terrestres. Esses aparelhos eram usados para o transporte, deslocamento de tropas, comunicação com patrulhas na mata, inquietação, etc. De modo geral, no local em que os helicópteros voavam haviam tropas em baixo, ou esquadrinhando a área. Houve casos também em que onde não havia helicópteros voando, existia tropa se movimentando. O helicóptero, em certo sentido, inquietava a tropa guerrilheira pois esta nunca sabia ao certo se tinha ou não tropa onde ela voava ou se era uma operação de despistamento.
Pelos dados que conhecemos, podemos resumir, no seguinte, a orientação em pregada pelo Exército: a) isolamento da área onde surgiu a luta guerrilheira, realizando para isso operações tipos policia, controlando a população, fazendo censura rigorosa, na imprensa e outros meios de comunicação; b) apresentar os guerrilheiros como terroristas, assaltantes de bancos, maconheiros, etc.; c) combater a guerrilha em todos os campos: político, econômico, militar e psicológico; e) procurar separar a guerrilha da população civil, tomando medidas severas como prisões de moradores, violências e assassinatos e também medidas demagógicas de atendimentos de reivindicações do povo; f) lançar sobre as guerrilhas grupos pequenos espalhados pela mata, usando os mesmos métodos de atuação dos guerrilheiros, com boas armas, bons mateiros, procurando estabelecer contatos com a guerrilha através dos rastros ou preparando emboscadas; g) uso intensivo do helicóptero e do avião; h) organização de um sistema da informação dentro da zo- [LACUNA NA REPRODUÇÃO DO ORIGINAL]
paração física dos elementos da guerrilha entre si, da sua base de apoio na população local e do Partido; j) pressão contínua sobre a guerrilha durante vários meses, não considerar a campanha terminada enquanto não liquidar totalmente o movimento.
NOSSAS TAREFAS ATUAIS
No ARAGUAIA, nosso Partido procurou aplicar a orientação traçada, no seu Documento sobre o CAMINHO DA LUTA ARMADA NO BRASIL, Cometeram-se erros e acertos. A guerrilha sofreu uma derrota temporária, o que não invalida o caminho traçado pelo nosso Partido para a conquista do Poder. A derrota se deve a erros na condução da luta e as deficiências que já foram assinaladas. Nas condições atuais do BRASIL, a conquista do Poder pelas forças revolucionárias se fará através da luta armada no campo, ou seja, o caminho do cerco das cidades pelo campo. As particularidades da situação brasileira que indicavam esse caminho não mudaram, mas ao contrario se aprofundaram. A ditadura se tornou mais feroz, a dependência ao imperialismo cresceu. O interior continua a ser o ponto mais débil da reação. Aí as forças revolucionarias têm mais campo de manobra, melhores condições para sobreviver, se desenvolver e criar seu Exército revolucionário. Devido ao desenvolvimento desigual do nosso país, tanto no plano político como econômico, a revolução também se desenvolverá de maneira desigual, não amadureceram simultaneamente as condições para a revolução em todo o conjunto do pais. No campo, crescem os choques entre os camponeses que querem terra para trabalhar, de um lado, e do outro os grileiros e latifundiários, e as empresas agro-pastoril. A situação no campo é grave do ponto de vista econômico e social. É necessário aproveitar essas condições favoráveis à revolução para se ligar mais aos camponeses e criar base política no campo. A luta armada nessa região fará com que amadureçam mais rapidamente as condições para a revolução no resto do pais. A luta não será fácil, terá vitórias e derrotas e será prolongada. A par da luta armada no campo, é preciso desenvolver a luta de massas nas cidades e também no campo; concentrar esforços na classe operaria, mobilizar os estudantes, por em movimento os camponeses e assalariados agrícolas. O rescimento e o fortalecimento do Partido é uma condição necessária para conseguir êxito na luta, tanto na cidade como no campo. Mas a revolução não é obra somente do Partido - a revolução é obra das massas, se as massas não estiverem convencidas da necessidade da revolução, se elas não se preparam, não se mobilizam e não se organizam, nenhuma revolução pode triunfar. É necessário dar atenção especial ao trabalho no campo, procurar estabelecer contato com as bases camponesas, para recrutar camponeses para o Partido.
Camaradas. Como prosseguir no caminho da preparação e desencadeamento da luta armada? A experiência do ARAGUAIA tem ou não validade? Em suas linhas gerais tem validade. É preciso aproveitar a experiência positiva, do ARAGUAIA, corrigir os erros e as deficiências. Nas condições atuais do BRASIL, com o inimigo atento, esse é o caminho mais indicado. Isto não significa ser o único caminho viável. É possível que no esforço para levar à prática a orientação da guerra popular apareçam novas experiências.
Sugerimos ao CC que se deve por em prática medidas tais como:
1) Escolher áreas boas do ponto de vista político, massas e mata que ofereçam cobertura e abrigo aos combatentes, que tenha recursos naturais e seja auto-suficiente em alimentos. Estas áreas devem estar localizadas de maneira que o inimigo não consiga isolá-las e que tenham possibilidades de exercer influencia sobre áreas vizinhas. De preferência, áreas onde hajam disputas de terras ou atritos locais.
2) A preparação na sua primeira fase deve ser feita de maneira clandestina. Os companheiros que realizam esse trabalho especial devem ter ótima cobertura e não devem fazer trabalho político aberto . Nesta fase a integração com as massas da região se deve fazer através do trabalho de amizade, respeito aos camponeses, aos seus costumes, religião, etc., assim como trabalho produtivo em comum. Deve-se aplicar o princípio de SERVIR O POVO, em tudo. A tarefa deve ser realizada com prudência e sem chamar a atenção do inimigo, Faz-se necessário conhecer bem a população, suas reivindicações, o terreno onde operarão no futuro, etc. Na fase seguinte, as tarefas serão realizadas de acordo com a situação concreta. Desde que estejam asseguradas as condições para a sobrevivência e a resistência no caso de ataque do inimigo, é possível se fazer um trabalho mais aberto. É preferível que a luta se inicie com a participação da massa, ou seja, em torno de problemas que ela sente.
3) A disposição dos companheiros no terreno deve ser mais dispersa do que foi no ARAGUAIA. Os grupos podem ser menores e espalhados numa área maior. Já no deslocamento dos companheiros, ir definindo com clareza as tarefas de cada
um, isto é, quem vai para os grupos armados e os que ficarão na infra-estrutura.
Estas diferentes tarefas devem ser realizadas simultaneamente.
4) Dar atenção a criação de organizações do Partido no campo, principalmente nas áreas nevrálgicas. O Partido deve ser organizado em rigorosa clandestinidade, de maneira que possa atuar em qualquer circunstância. Nestas áreas não se deve fazer propaganda escrita de materiais do Partido. A atuação deve ter o Maximo de cobertura. Isto exige métodos corretos de atuação. O trabalho do Partido deve ser compartimentado do trabalho especial.
5) É preciso dar atenção à mobilização de companheiros que poderão ser utilizados para o trabalho especial e de campo. Na seleção, o critério deve ser fundamentalmente, político, ideológico e físico (os combatentes). É preciso dar atenção ao trabalho de ganhar médicos, enfermeiros, técnicos de rádio, explosivos, etc.
6) Desenvolver o estudo da arte militar, esforçar-se por formar quadros militares que dominem a técnica da guerra popular.
Quanto ao ARAGUAIA, devemos continuar nos esforçando para manter acesa a chama, buscando restabelecer o contato e criando condições para o seu desenvolvimento. Continuar a fazer a propaganda política da luta, sem no entanto exagerá-la."
Notas:
(1N) Cópia da Documentação apreendida pela repressão no aparelho do PC do B na rua Pio XI, São Paulo em dezembro de 1976. Mantidos a grafia e os grifos da fonte.
(2N) ULDP - União pelas Liberdades e pelos Direitos do Povo
(3N) Aciso - Ação Cívica Social
(4N) CM - Comissão Militar
http://www.marxists.org/portugues/tematica/misc/analise-arag-pcdob.htm
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